Entrevista com Rodrigo Faour, autor de "História Sexual da MPB" (parte 2)
Em entrevista para o “Outras Palavras”, o autor
do livro “História Sexual da MPB – a evolução do amor e do sexo da canção
brasileira” (clique aqui para ler a resenha), Rodrigo Faour, contou que
trabalhar com música é um grande desafio, por estarmos num país que não valoriza a
própria cultura e que se esvazia cada vez mais neste sentido, principalmente
por imitar o pior da cultura norte-americana. “Até no modo de cantar, incluindo
cantores gospel que acham que só é possível chegar a Deus imitando cantores ‘gritadeiros’
americanos, e ainda os cantores de barzinho que imitam os maneirismos vocais da
‘soul music’ achando que isto sim é cantar bem.”, criticou o jornalista,
produtor e pesquisador musical.
De acordo
com Rodrigo Faour, é preciso muita garra e coragem para se estabelecer nessa profissão no nosso país, e um dos motivos é a falta de valorização dos próprios editais
culturais. “Viver deste ofício, hoje, no Brasil significa suar a camisa para
pagar as contas e para fazer a sua arte chegar ao público que ainda gosta de
uma música mais adulta e rezar para àqueles que gerenciam os editais culturais
ou as empresas que patrocinam cultura gostem dos nossos projetos e nos deixem
trabalhar. É quase uma ditadura às avessas. Sem contar que os grandes meios de
comunicação infelizmente divulgam majoritariamente mediocridade e aí se cria um
círculo vicioso que parece nunca vai ter fim. É bom lembrar que até os anos
80 havia muito mais programas musicais na TV e tanto o meio televisivo quanto o rádio eram
bem mais democráticos”, explicou.
Eu ainda
ouço muita gente dizer “Eu preferia ter nascido nos anos 80” por considerar
essa década muito melhor, musicalmente falando, à atual. Para o autor de “História
Sexual da MPB”, isso acontece porque desde o fim dos anos 80 houve uma decadência
nesse quesito. “Dos anos 30 aos 80 do século passado
fizemos uma música imbatível. Do fim dos 80 para cá começou a decadência. Por 'decadência' leia-se o afastamento de tudo que seja uma música mais adulta, com letras um
pouco mais densas, com interpretações recheadas de nuances e arranjos mais bem
trabalhados. De lá para cá, só se deu valor aos modismos massificados que,
claro, sempre tiveram algumas canções interessantes, mas que no geral foram um
tanto descartáveis", avaliou Rodrigo, acrescentando que as rádios, atualmente,
de um nível melhor, basicamente vivem de flashback dos anos 80, porque são
músicas ainda bem atuais e melodiosas.
Sobre um músico com preconceitos musicais,
Rodrigo Faour concorda que o ideal é estar aberto a tudo, mas prefere que cada um
tenha o seu limite, reconhecendo que ele mesmo se sente na
obrigação de ouvir gêneros musicais que não aprecia. “Dizer que gosta de tudo só
para ficar bem na fita é hipocrisia. Todos tem o direito de gostar ou não do
que quiser. Eu, como especialista, muitas vezes me forço a ouvir até gêneros
que não gosto para colher ali pérolas, e me surpreendo com o que encontro –
para o bem e para o mal. Generalizar é que é o perigo. Em todos os estilos há
sempre algo interessante, é só procurar. Às vezes dá preguiça, eu compreendo,
pois ouvir cantores padronizados que cantam mal, e ainda com poéticas
vagabundas pra se achar ouro no meio do lixo é dose, mas com paciência é
possível encontrar. Pois até no mais sofisticado dos gêneros tem porcaria também,
por isso nunca é bom generalizar”, criticou.
Mesmo depois de tudo isso e contando que canta e toca violão, Rodrigo
Four não se considera músico, mas sim um artista da música, pois está sempre
criando projetos e recriando enfoques sobre as obras que, na opinião dele,
ainda têm algum valor no nosso país. “Ser músico ou trabalhar com música é ter a
sensibilidade à flor da pele e sentir tudo de uma forma mais intensa. Assim eu
sou e assim vejo que são todos os que eu julgo serem realmente grandes artistas
não só da música, como das artes em geral”, concluiu o autor de um dos meus
livros favoritos sobre música : “História Sexual da MPB”.
Comentários
Mano, Parabéns. Espero poder me deleitar com mais entrevistas de autores de outros estados.
Quando se fala de música eu já me encanto hehe, mas realmente ter que ouvir o que não se gosta é tenso.
Fico muito feliz por cada entrevista que você faz,que venha muitas outras porque você merece.
Estou de longe,mas sempre na torcida! Um Beijo.
A estética do texto, seu vernáculo aplicado e a coesão de ideias estão bastante desenvolvidos. Além disso, a entrevista ficou muito boa e foi muito além do lugar comum, mostrando que tanto entrevistado quanto jornalista são bastante inteligentes e eloquentes. Eu confesso que não entendo muito dos detalhes dos bastidores da música brasileira, em especial pré-anos 80, de modo que a matéria foi muito esclarecedora em vários sentidos.
Mas sei que um livro que trata sobre o cenário musical dessa época e os bastidores regados a sexo e drogas tem muito a discutir. Rola me emprestar esse livro? Meu único temor é que não seja tão bom quanto sua reportagem :)