Outras Versões: Do sertanejo à MPB (1)

O sertanejo não é o meu forte, mas quem disse que eu não o ouço? Nos anos 90 surgiram canções sertanejas que se tornaram clássicos da música brasileira, uns pela importância histórica do caipira e outros pelo romantismo exacerbado, bonito e às vezes meio bobinho. Algumas músicas tiveram regravações de artistas do mesmo segmento e outras, as novidades mais inimagináveis, como é o caso de É o amor, da dupla Zezé de Camargo e Luciano, Não aprendi a dizer adeus e Pense em mim, ambas de Leandro e Leonardo. Prepara-se para cair numa fossa diferente com esses velhos hits nacionais que eu sei você, ainda que não seja um admirador, conhece a letra do início ao fim e ainda solta o gogó no karaokê.


Maria Bethânia, a intérprete da MPB de cabelos cacheados e da voz rouca mais sexy, mudou o rumo de É o amor, em 1999, no álbum A Força Que Nunca Seca e na trilha sonora do filme Dois Filhos de Francisco, de 2005, o longa-metragem que conta a história da dupla Zezé de Camargo e Luciano. A música em questão toca quase que por completo em uma das cenas mais sensíveis: quando foi composta por Zezé, interpretado por Marcio Kileing. Quem a ouve fica mais atento na letra de É o amor, e o motivo está ligado à sua intérprete, uma das maiores da MPB, que carrega comoção e naturalidade na voz e ao teclado que a acompanha durante a execução, diferente da desafinação meio constrangedora de Zezé de Camargo, costumeiro a destruir as próprias criações - e ainda pensa que tá abafando. E se você é daqueles que rejeita É o amor por ser um sertanejo ou sei lá por qual razão, talvez mude de ideia ao se deleitar com a versão de Maria Bethânia. Fábio Jr também deu um toque romântico diferenciado a esse sucesso, e Raça Negra, Gustavo Lima e a dupla Bruno e Marrone também fazem entender que a vida é feita pra viver.

O tom de sofrimento, sem a fossa do sertanejo da gravação original, também ocorre em Não aprendi a dizer adeus, de Joel Marques, na voz do ator Alexandre Nero. No álbum Vendo Amor, de 2011, essa pérola na voz de Leandro e Leonardo, de 1991, é agraciada com uma versão de profundo baque no coração, com a suavidade do ator global e o acolhimento instrumental de saxofone e teclados para lagrimar ainda mais a música. Fechando os olhos e dando atenção a essa regravação, há a impressão que a letra retrata a amargura do narrador pela morte de alguém muito querido. Uma sensação de abandono ainda mais forte que uma dor de cotovelo e isso embelezou a peculiaridade da nova roupagem de Não aprendi a dizer adeus de Nero. Os artistas sertanejos Eduardo Melo e Chitãozinho e Xororó também a regravaram, mas vale ressaltar os registros da sanfona e voz de Bruna Caram e a singularidade do ao vivo de Luiza Possi.

Pense em mim, composta por Douglas Maio, Zé Ribeiro e Mário Soares, hit também com a dupla Leandro e Leonardo, de 1990, teve regravações inusitadas. Uma delas esteve na trilha sonora da minissérie Justiça, no ano passado, da Rede Globo. O performático, de vocal desinibido e fora do padrão Johnny Hooker rasgou do sertanejo ao pop, do seu próprio jeito de se jogar nos braços da canção e dá chance aos fãs de conhecerem um outro lado de Pense em mim. Destoando da gravação original, não só o nada clichê Hooker, mas também a versão pop e sensual de Yann, um cara novo no cenário musical brasileiro. Com uma batida eletrônica bem sutil, a musicalidade de Yann mescla com a oralidade, revelando o tom meio dançante da versão de Pense em mim. O clip dele também embala numa sensação nostálgica e intensa. Johnny Hooker e Yann fazem você esquecer por alguns instantes que é aquela conhecidíssima dor de corno em forma de música de 1990. 

Essa é a graça da música, da arte: elas se renovam. Mesmo eu não sendo fã de um gênero musical, como o sertanejo, não quer dizer que não aprecio as canções. Conhecer novas versões é o que mais me aproxima dos mais diversos estilos e me atualiza no meio musical. E É o amor, Não aprendi a dizer a adeus e Pense em mim, cada uma com uma pegada nova e razoavelmente distante do sertanejo, prova como um estilo pode se aventurar no outro, eternizar as obras e deixar a sua fossa ainda mais atraente. Uma sofrência das antigas, tocada com outros arranjos pra você lembrar do/ a ex, daquele chifre doloriiido, pra curtir uma conchinha ou pra qualquer outro solavanco no coração que só o amor é capaz de nos proporcionar.  

Sigam @SertanejoNaWeb no Twitter! 

--->> Deixe seu comentário (com críticas, sugestões, elogios, cantadas...) aqui em baixo, ou no link do facebook ou compartilhe nas suas redes sociais e faça o Victório mais feliz <<--- b="">

Comentários

O sertanejo brasileiro realmente tem umas pérolas inesquecíveis que marcaram a infância de muita gente, e é bem legal ver que o pop de vez em quando faz boas homenagens a clássicos desse gênero que ainda desperta ligeiro preconceito em mentes menores e mais fechadas.
Como toda análise musical sua, esse texto é uma boa pedida. E as músicas para escutar são um agrado a mais que vc nos proporciona.

Postagens mais visitadas