"PAIXÃO CRUEL, DESENFREADA", Trecho de "Exagerado"



Acabei de ler, pela segunda vez, o livro “Cazuza - Só as Mães São felizes”, de Lucinha Araújo, em depoimento à jornalista Regina Echeverria. Cazuza teria feito 53 anos dia 4 de abril se não tivesse, praticamente desistido de viver, quando descobriu que havia sido atingido pelo vírus do HIV. Ele escolheu: matar-se aos poucos, abandonando os remédios e se drogando em abundância. Enfim, Agenor de Miranda Neto, o Cazuza, no dia 7 de julho de 1990 deixou os seus fãs órfãos, mas com boas heranças: poesia, voz, e a revolução da música nacional.
A primeira música interpretada por Cazuza foi “Odara”, de Caetano Veloso, na peça teatral “A noviça rebelde”, no Circo Voador. “Mal me segurando naquela mistura de surpresa e emoção, ainda vi meu filho interpretar ‘Edelwis’”, contou Lucinha Araújo, no livro. “Sua participação no espetáculo não tinha uma fala sequer. Só cantava. Sem refinamento ainda, mas com que o caracterizaria no futuro. Foi uma descoberta e tanto para mim, porque, embora criado numa ambiente musical, Cazuza jamais havia demonstrado seus dotes de cantor”.
Ao lado do parceiro Frejat, Cazuza compôs canções de sucesso, como “Maior abandonado”, “Bete Balanço”, “Bilhetinho azul”, “Todo amor que houver nessa vida”. Em 1983, Caetano Veloso cantou esta última no palco do Canecão, no Rio de Janeiro, aclamando Cazuza como “o melhor poeta de sua geração”. “A música ‘Todo amor que houver nessa vida’ é uma obra-prima”, disse Caetano em “Só as mães são felizes”. “Cazuza era um romântico autêntico. Isso foi o que deu à poesia dele um poder de comoção muito grande, porque ele era ‘cem por cento’ autêntico e isso a gente sentia”.
Em depoimento para o DVD “Tributo a Cazuza” de 1999, Frejat afirmou que o parceiro tem uma grande importância como letrista dentro da música brasileira, talvez porque ele seja o que melhor represente uma maneira de uma geração falar e se expressar. Como curiosidade às composições, Frejat comentou: “Cazuza ficava muito ansioso. Quando ele me dava uma letra, ficava louco pra que eu fizesse logo a música. Às vezes eu demorava um ou dois dias e ele ligava: ‘E aí já fez? Porra, tá demorando muito!’. Ele ficava muito ansioso pra que eu fizesse logo. No começo a gente fez muitas, que quase que diariamente a gente fazia uma música”.
Parceiro de Cazuza em muitas composições, como “Brasil”, “Solidão que nada” e “Burguesia”, George Israel definiu Cazuza, no DVD “Tributo a Cazuza” de 2009, como sofisticada e nada óbvias. “A quantidade de coisas que Cazuza fazia, com o tempo que ele estava vivendo a vida, em casa, sozinho. Então, a impressão que se tinha e que saía tudo muito fácil e ao mesmo tempo um apuro e sofisticação”. Responsável pela melodia de “Exagerado”, Leoni conta no mesmo álbum que Cazuza era um dos maiores poetas de todos os tempos da música popular brasileira. “Ele está contido na nossa geração, até porque ele misturava outras coisas, como samba-canção. A postura era o rock, mas não era só isso”, explicou um dos autores do hit, que, de acordo com Leoni, teve o impulso de Ezequiel Neves.
Das letras mais melosas, como “Faz parte do meu show” ao mais bizarro, como “Só as mães são felizes”, Cazuza foi capaz de transpor todo o seu viver, do mais alegre ao mais angustiante. Era autêntico e sugestivo em suas obras, o que as fazem cada vez mais vivas, contemporâneas e tocantes. A vivacidade é tanta, que a impressão que fica é que o poeta está vivo, com a mesma empolgação e timidez, pro mundo inteiro acordar. E a gente dormir...

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