Resenha: "Todo dia", de David Levithan (livro)

“Todo dia” é um dos últimos e mais interessantes livros que já li, por ter uma história quase que inimaginável, com uma narrativa apreciabilíssima, um desfecho justo e uns puxões de orelha nos próprios leitores. O autor é David Levithan e conta a história de A, um rapaz que acorda todo em dia em um corpo de uma pessoa diferente e com vidas diferentes, sendo que a cada capítulo do livro relata um dia dessas variadas vidas. E sim, o nome dele é A, porque nem ele sabe ao certo qual nome ele tem e só se percebe que ele (possivelmente) é do sexo masculino porque se apaixona por uma garota.
A, logo no primeiro capítulo, amanhece dentro do corpo de Justin, um garoto de dezesseis anos, que não é lá muito gentil com sua namorada (de nome estranho) Rhiannanon. Mas para fazê-la feliz, o protagonista a leva para a praia e age como ele mesmo, esquecendo que aquele corpo pertence ao Justin, um namorado não muito atencioso. Já no dia seguinte, A acorda na vida de outra pessoa, e desta vez do sexo feminino, porém ainda com Rhiannanon em mente e decide manter contato com ela através de e-mail e isso no corpo de outras pessoas que não têm vínculo algum com ela. Pouco se demora para ele perceber que é paixão o que sente por ela, assim como ela, mesmo que seja a mais absurda das situações, também admite, com o tempo, estar apaixonada por ele.
Os desafios que A enfrenta por dia não são poucos. O dia amanhece e ele se depara com um outro corpo, seja homem ou mulher, e tem que se adaptar e aprender ainda nos primeiros minutos a personalidade dele/ dela para que os amigos e familiares não desconfiem de nada e nem atrapalhe da vida do “incorporado”. Ocorrem novos e secretos encontros com Rhiannanon e os desafios aumentam, já que A tem que se relacionar com ela envolvendo e pondo em risco a vida dessas pessoas. E o fato de não saber qual o sexo e quais caraterísticas terão o próximo indivíduo é o que também nos prende na leitura de “Todo dia”, atiçando a nossa curiosidade e comprovando o quão criativo e intrigante é David Levithan.
No meio disso tudo, há algo em “Todo dia” que me chama mais atenção. Em um dos dias, A acorda no corpo de Kelsea, uma moça que tem problemas em casa e está pensando seriamente em se matar. A partir daí, a preocupação do protagonista é outra: de evitar o suicídio dela, e com a ajuda de Rhiannanon. E durante quase todo o livro, Levithan nos ensina, através de A - um personagem que cresceu acordando no corpo de outras pessoas e bloqueando qualquer tipo de pré-julgamento em relação àquele que habita -, que nos falta empatia, ou seja, nos falta compreender melhor o outro, com todos os seus problemas, incertezas e falhas. Porque o ser humano não compreende o outro como deveria, não dimensiona o seu sofrimento e não o olha como a si; ele vê o outro apenas como sua casca e se o que há por fora o incomodar ou estiver fora dos padrões aceitos social e moralmente, ele não deve ser respeitado ou simplesmente só o valoriza quando o convém. Além de uma trama bem escrita, envolvente e com um “gostinho de quero uma continuação”, “Todo dia” (o livro que me foi emprestado e acabei ganhando de presente do meu amigo Thyago) nos força a perceber o quão mesquinho e egoísta nós somos, às vezes, quando olhamos apenas para o nosso umbigo. E pra mudar, basta querer.

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